domingo, 30 de agosto de 2009

música do dia



a música é liiinda. e o vídeo, um charme à parte, ahn?

sábado, 29 de agosto de 2009

especial: carlos drummond de andrade

confesso que o drummond não é dos meus poetas preferidos. mas tenho verdadeira paixão por esses poemas:

Poema de Sete Faces

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo,
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

Quadrilha


João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

Memória

Amar o perdido
deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.

As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão.

Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão.

Os Ombros Suportam o Mundo


Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.

Congresso Internacional do Medo

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio porque esse não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte,
depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas.

Mãos Dadas

Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.

O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.

ouvindo: beatles. i`m so tired

linklist

não dá pra criar um tópico pra cada link legal que eu encontro. então resolvi fazer um post com todos os links-mais-legais-dos-últimos-tempos.

blog do andré valente: o projeto atual é ilustrar filmes. muito legal!

ângulo: super cult.

le blog de betty
: francesa linda e estilosa posta suas melhores produções.

garance doré: igualmente francês e estiloso. com ilustrações.

face hunter: também de streetstyle, mas cosmopolita. amei a série de fotos do japão.

quero te pegar sóbrio: o nome já indica o espírito romântico, reflexivo e bem-humorado do blog. mais ainda: é literatura da boa.

fim de expediente: um ator, um escritor e um economista discorrem sobre aleatoriedades. adoro!

graphjam: filosofia em gráficos.

the photographic dictionary
: é isso mesmo: um dicionário fotográfico.

favoritos: pega o espírito desse post e multiplica por um blog inteiro.

ouvindo: marcelo camelo. doce solidão

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

esquentando os motores

não, eu ainda não sei se vou falar sobre as próximas eleições presidenciais. vai depender dos candidatos (marina silva vem aí?), do meu estado de espírito e da configuração cósmica dos astros.

por enquanto deixo essa notícia, que me inspirou.

ouvindo: milton nascimento. beijo partido

sábado, 22 de agosto de 2009

o estripador de laranjeiras

carlos eduardo novaes

As pessoas estão com medo. Expressões tensas, gestos nervosos, olhares desconfiados, todos à beira do pânico. Uma simples faísca pode provocar a explosão.

Constatei esse clima uma tarde quando saí de casa para comprar pão. Parado na porta da padaria, já com os dois pãezinhos debaixo do braço, num momento de bobeira, acendi um cigarro, olhei o tempo e procurei pelas horas. Não havia relógio à minha volta. Vi uma senhora caminhando apressada pela calçada, bolsa apertada contra o peito. Aproximei-me, sem ser visto, e toquei de leve no seu ombro. A mulher virou-se e deu um berro monumental:
- UAAAAAIIIIII - E saiu correndo.

Precipitou-se uma reação em cadeia. A mulher correu para um lado, eu, sem saber do que se tratava, corri para o outro, o jornaleiro se abaixou atrás da banca, o empregado da padaria arriou rápido a porta de ferro, o guarda de trânsito, de um salto, escondeu-se atrás de um carro, algumas pessoas correram em busca de proteção e alguém gritou: "Pega ladrão". Ouvi o grito no meio da corrida, parei de estalo e olhei para os lados querendo saber em que direção ia o ladrão (naturalmente para tomar a direção oposta). Ao parar, observei um grupo a uns 30 metros de distância correndo na minha direção aos berros de "pega ladrão". Recomecei a correr e, por via das dúvidas, passei a gritar também "pega ladrão".

Será que o ladrão sou eu? - pensei enquanto corria. A turba que vinha atrás de mim, mostrava-se enfurecida demais para ouvir explicações. Dobrei a rua na disparada, vi um caminhão da PM estacionado e tratei de entrar no edifício onde mora um amigo meu, Rubem, médico homeopata.
- Que houve? - perguntou ele, ao me ver ofegante, com cara de raposa, aquela raposa perseguida nos campos ingleses por cachorros perdigueiros e cavaleiros de casacos vermelhos.
- Não sei, Rubem. Acho que estão perseguindo um assaltante aí na rua. Eu tô com medo. Posso ficar um pouco aqui em sua casa?
- Claro, claro. Fique à vontade. Eu já estava saindo. Vou lá no orelhão dar uns telefonemas. Talvez me demore. Você, por favor, não faça barulho que ma- mãe chegou agora da rua, foi dormir um pouquinho. Ela anda muito tensa com essa onda de assaltos, você sabe...

Rubem desceu. Dei um tempo para recuperar a respiração normal e fui até a janela ver se já haviam apanhado o ladrão. Quando abri a janela e meti a cara lembrei-me do Papa em suas aparições na sacada da Basílica de São Pedro: havia uma multidão na rua, que ao me ver começou a gritar:
- Olha ele lá - Tá lá o assaltante! - gritavam, apontando para mim. - Pega! Já invadiu um apartamento! Pega!
Quer dizer que o ladrão sou eu? Permaneci alguns segundos sem entender, depois passei a gritar para a turba lá embaixo, gesticulando:
- Não! Não sou eu, não! Eu não! Deve haver algum engano!

A turba não ouvia. Gritava e babava de ódio. Afastei-me da janela pensando em como me explicar melhor. Sem querer, esbarrei num vaso em cima de uma cristaleira. O vaso se esborrachou no chão com grande estardalhaço. Curvei-me em silêncio para catar os cacos e ouvi uma voz feminina atrás de mim:
- Rubem?
Quando me virei, a senhora fez uma expressão de pavor e correu para a janela aos berros:
- Socorro! Socorro! Me salvem! Ele me seguiu até aqui! Quer me matar com um caco de vidro!
Tentei me explicar. A senhora, em estado de choque, não ouvia nada:
- Ele vai me matar! Ele vai me matar! - uivava, debruçando-se na janela.

Que loucura! Antes de mais nada, pensei, tenho que tirar essa velha doida da janela. Aproximei-me, tapei-lhe a boca e puxei-a para dentro. Naturalmente, fui visto pela multidão lá embaixo que, diante da cena, passou a entoar um novo coro:
- Olha lá! Olha lá! Ele vai matar a velha!
- É o tarado da Gago Coutinho! Só ataca velhas!
- Peguem o assassino!
- Peguem o Estripador de Laranjeiras!

A essa altura havia milhares de pessoas na rua. A PM, que pedira reforços, passou um cordão de isolamento diante do prédio e já contava com apoio da Polícia do Exército, do Corpo de Bombeiros, dos Fuzileiros Navais. Alguns helicópteros sobrevoavam o edifício. Dentro do apartamento, eu rolava pelo chão numa luta corporal com a velha. Como não sossegasse, fui obrigado a lhe aplicar um golpe de caratê para que desmaiasse. Depois, ao acordar eu daria as explicações necessárias e pediria desculpas. Levantei-me, deixando a senhora com as vestes rasgadas estirada no tapete. Ouvi, então, uma voz vindo da rua através de um alto-falante:
- Atenção! Atenção, Estripador de Laranjeiras, se você não sair, nós vamos entrar! Deixe suas armas e saia pela portaria principal com as mãos sobre a cabeça! Atenção, Estripador, você tem cinco minutos para sair!

Juro que não sabia o que fazer. Olhei à volta. Minhas armas eram dois pãezinhos franceses. Tinha saído para comprar pão e só porque a população da cidade está tensa já virei o Estripador de Laranjeiras. Onde está o Rubem que não chega? Rubem, atrás do cordão de isolamento, discutia com o coronel-chefe da Operação Estripador.
- O senhor não pode entrar! - dizia o coronel.
- Mas eu moro aqui no prédio.
- Sinto muito, mas tem um assassino à solta dentro do prédio. Só estamos autorizando as pessoas a sair. Entrar, nunca!
- Eu só saí para dar uns telefonemas, - insistiu Rubem. - Estou com um amigo lá em casa.
- Qual é o apartamento em que o senhor mora?
Rubem caiu na asneira de apontar. O coronel arregalou os olhos.
- Mas é onde está escondido o Estripador de Laranjeiras!
- O quêêê? - berrou Rubem.

E não teve tempo de dizer mais nada. O coronel gritou: "é cúmplice" e imediatamente um bando de policiais caiu sobre o Rubem, arrastando-o para um camburão.
- Pegamos o cúmplice - disse o coronel para o capitão. - Agora só falta o Estripador. Quantos minutos já se passaram?
- Quatro! Se ele não sair, coronel, creio que só há uma solução: pedir aos moradores para evacuarem o prédio e implodí-lo.
- Atenção, Estripador - berrou o coronel no megafone. - Você tem apenas um minuto para descer. Largue essa velhinha, que nada lhe acontecerá!

Lá embaixo os boatos fervilhavam. Ninguém tinha dúvidas de que eu havia invadido o apartamento daquela senhora. Algumas pessoas, enquanto aguardavam o desfecho, diziam aos policiais que o Estripador tinha preferência por senhoras com mais de 70 anos. No apartamento, eu não sabia o que fazer. Ficar seria pior: eles acabariam arrombando a porta e, como nos filmes, iam entrar atirando. Resolvi me apresentar. Desci os três andares pela escada e parei na porta do prédio, segurando sobre a cabeça, com as duas mãos, o embrulhinho cinza da padaria. Um silêncio de espanto correu pela espinha da multidão. Observei as pessoas cochichando.
- Olha a cara dele! Cara de facínora!
- Repara no ar de tarado! Olha as olheiras! É um criminoso típico! Não engana ninguém!
Escutei os ruídos de algumas armas sendo engatilhadas. O coronel, à distância, gritou para mim:
- Jogue fora essa arma que você tem aí embrulhada, Estripador.
- Não é arma: é o meu pão!

O coronel deu um sorriso de descrença. Entre eu, na porta do prédio, e a tropa havia uma distância de uns 20 metros. Desembrulhei o pão e joguei-o aos pés do coronel. O coronel ao ver aquele objeto (não identificável) voando na sua direção, correu e gritou:
- Corram! Abaixem-se!
Foi uma correria infernal. Abriu-se uma clareira em torno do pão que caiu, quicou duas vezes e parou. Todos olhavam para o pão esperando que explodisse a qualquer momento. Ninguém tinha coragem de se aproximar.
- Vá chamar um desativador de bombas - disse o coronel, olhando de binóculos para o artefato de trigo. - Diga que a bomba está dentro de um pão. . . um pão francês.

Como o pão não explodiu, a tropa de choque levantou-se e foi caminhando para ele, com vagar e temor. Quando já estavam a um metro do pão, eu, que continuava parado na porta do prédio, joguei o segundo. Saiu todo mundo correndo novamente. Coloquei as mãos na cabeça e me entreguei ao coronel. - Que é que você estava fazendo com esses pães, Estripador?
- Tinha acabado de comprar. Saí só pra comprar pão.
- Sei, sei. Conta outra, Estripador - comentou o coronel com um sorriso irônico - quer me dizer que esse alvoroço todo foi só porque você saiu para com- prar pão?
- Não, senhor. Tudo isso aconteceu porque eu fui perguntar as horas a uma senhora.
- Perguntar as horas? - repetiu o coronel sem acreditar.

O coronel chamou o capitão. Ouvi quando ele disse baixinho: "Trata-se de um louco; traga uma camisa de força; vamos interná-lo num hospital psiquiátrico". No momento em que eu ia começar a me explicar, aproximou-se um sargento que tinha ido revistar o apartamento dizendo que a senhora estava desmaiada na sala com as vestes rasgadas. Bem, aí desisti e tratei de me compenetrar que eu era mesmo o Estripador de Laranjeiras.

ouvindo: milton nascimento. imagem e semelhança

terça-feira, 11 de agosto de 2009

música do dia

a música do dia, na verdade, são três.

a história começa comigo escutando o disco milton nascimento & belmondo. fiquei absolutamente maravilhada com a versão de travessia. como é de praxe, corri pro youtube pra colocá-la aqui. uma pena: não achei. mas achei essa outra versão, também muito bonita:




desse mesmo show vem esse outro vídeo, meu xodó já há mais tempo, por ser umas das minhas músicas preferidas:




e foi nessa busca despretenciosa que encontrei a pérola do dia. milton e chico. (que se estapeiam pelo título de meu artista preferido). e não é só isso. nunca vi algo que demonstrasse tão bem o meu conceito de beleza. (importante, né? pois é.)




ouvindo: milton nascimento & belmondo. nada será como antes